terça-feira, 10 de maio de 2011

Tendências de consumo


A criança da sociedade de consumo nasce em um ambiente em que a marca se faz
muito presente. Grande parte dos produtos a sua volta possui uma etiqueta, que se
constituem em uma marca dotada de algum valor simbólico. Quando muito pequenas, elas não conseguem entender, mas desde então estão inseridas no contexto do consumo. Retiramos do livro Crianças do Consumo – a infância roubada, o seguinte trecho:

“Ao anunciarem roupas de cama, móbiles e brinquedos de berço decorados com
logos de marcas ou imagens de personagens licenciados, os profissionais de
marketing fazem o que podem para assegurar que os bebês reconhecerão e
pedirão produtos decorados de maneira semelhante, que vão desde cereais até
bichinhos de pelúcia, à medida que suas habilidades verbais evoluírem”

As marcas desde cedo expostas às crianças passam a fazer parte do seu cotidiano, participando da sua vida em fase de formação. Logo, por mais que a criança muito pequena nesse momento não associe esses objetos licenciados ao consumo, ela aos poucos já está se familiarizando com esses produtos. Mais tarde, a tendência é que ela continue a utilizar a marca com que se sinta mais à vontade (aquela que está em sua vida desde o nascimento) e é nessa fidelização que residem os esforços do marketing voltados para o público infantil.
Retiramos o trecho a seguir do livro Cultura Infantil, a construção coorporativa da
infância:

“Usando fantasia e desejo, os funcionários coorporativos têm criado uma
perspectiva na cultura do fim do século XX que se mescla com ideologias de
negócio e valores de livre mercado. A visão de mundo produzida pelo
propagandista corporativo, em qualquer proporção, sempre leva as crianças a
pensarem que as coisas mais excitantes que a vida pode proporcionar são
produzidas pelos seus amigos da América coorporativa. A lição de economia é
poderosa quando repetida centenas de vezes”

Em outras palavras, a publicidade utiliza-se da “fantasia” para envolver as crianças, que desde cedo são incentivadas a experimentarem as sensações pelo produto.

Segundo uma pesquisa da NICKELODEON Business Solution Research,
realizada em 2007,  há 48,8 milhões de crianças no Brasil. O quadro abaixo, retirado da
mesma pesquisa, mostra o quanto foi gasto no Brasil com o mercado infantil no último
ano:

Mercado Infantil
Brinquedos R$ 1 bilhão
Publishing (revistas, HQs, figurinhas) R$ 353 milhões
Higiene pessoal, Perfumaria e Cosméticos R$ 102,8 milhões Fonte
Fast Food R$ 5 bilhões
Parques R$ 120 milhões.
Cinema (bilheteria) R$ 200 milhões
DVD Infantil R$ 160 milhões
Assinatura TV por assinatura R$ 60 milhões

A tabela confirma que a criança é, sem dúvida, um negócio lucrativo para
grandes empresas. Por isso, existem cada vez mais itens voltados para elas, que variam desde produtos infantis (como brinquedos e roupinhas) a produtos e serviços inicialmente direcionados ao público adulto, como cosméticos ou eletroeletrônicos. O seguinte trecho, retirado de uma matéria publicada no jornal O Globo, fala sobre isso:

“A exemplo da indústria de tecnologia e do varejo, o setor de beleza também não
ignora o potencial do consumidor infantil. Nem deveria. Como deixar de lado
uma consumidora como Ingrid Vieira, de 6 anos? A pequena não sai de casa sem
sua superprodução. Adora pintar as unhas, usa várias presilhas coloridas e está
sempre com um penteado diferente. Vaidosíssima, usa Juicy Tubes, um gloss
labial da Lamcôme. E seu perfume predileto é Anais Anais, da Cacharel. – Adoro
tanta coisa. Maquiagem, brinquedo e roupa – disse Ingrid, que se espelha em sua
mãe na hora de fazer suas escolhas de consumo.”

Não se pode afirmar que os hábitos de consumo dos adultos se assemelham aos
do público infantil. Nessa matéria percebe-se que mesmo quando usa produtos de ordem adulta, a criança ainda o faz de maneira fantasiosa, “brincando” enquanto o faz. Também se pode considerar esperado que a criança se inspire na mãe, uma vez que é a representação feminina mais próxima a ela. Nosso grupo visitou algumas lojas voltadas para o público infantil, e uma gerente de uma loja de calçados infantis fez a seguinte afirmação:

“Nós vendemos sapatos desde o número zero até o trinta e nove. Não fazemos anúncios voltados para o público adulto porque não é interessante para nós que você (ela dirigia-se a uma integrante de nosso grupo, de 20 anos), por exemplo, venha na loja e compre um sapato. Porém, muitas crianças vêm aqui e não querem saber de nenhum de nossos modelos, querem um modelo igual ao que a mãe ou a vó usam. Então temos alguns modelos em numeração grande, porque assim a mãe e a criança vêm aqui e compram o mesmo sapato.”

Como as corporações percebem esse processo de a criança querer copiar a mãe, se apoderam dele para criar novos nichos de mercado, como a venda de maquiagem e cosméticos direcionados ao público infantil. O que antes consistia em uma experiência lúdica de se representar a partir da figura materna transforma-se na possibilidade de um novo mercado e fonte de lucro para as empresas. O trecho a seguir, da mesma matéria do jornal O Globo, mostra como as empresas se aproximam desse público, criando produtos específicos para ele:

“A Natura tem uma linha para criança que reúne 14 produtos – dois foram lançados
em fevereiro (xampu e condicionador de maçã verde). O Boticário, por sua vez,
reúne na Ma Cherie dez itens para suas consumidoras mirins. A cada ano, dois
novos produtos são lançados para esse cliente, a partir de pesquisas com crianças
entre 4 e 10 anos realizadas periodicamente. – A menina muitas vezes opta por
um cosmético em vez de um brinquedo. E esse consumo é incentivado pelas mães
e pelas amigas. Percebemos ainda que existe um desejo de consumir. Elas olham
para o perfume, por exemplo, e falam “eu quero”, “eu preciso” – disse Tatiana
Ponce, gerente de marketing de Perfumaria e Linha Infantil de O Boticário”

A criança hoje é vista como um indivíduo atuante na sociedade contemporânea, podendo ter um “papel ativo na constituição das relações sociais em que se engaja, não sendo, portanto, passiva na incorporação de papéis e comportamentos sociais” (Cohn, 2005, p.27). Na sociedade de consumo, as crianças têm a possibilidade de estabelecer uma relação umas com as outras e também com os adultos através dos produtos e das marcas, participando ativamente das relações sociais inseridas nesse contexto; muitas delas “pedem” para seus pais que comprem, por exemplo, determinado carro, mesmo não tendo idade para dirigi-lo.

Mas não são apenas os produtos e serviços voltados para o público infantil que
atraem a atenção do marketing para o consumidor mirim. Ainda segundo a pesquisa
realizada pela Nickelodeon Business Solution Research (2007), foi constatado que 88,5% das crianças de 6 a 12 anos acompanham a pessoa responsável pelas compras e, sendo assim, exercem também forte poder de influência sobre produtos de uso doméstico ou familiar, elegendo a marca de produtos como alimentos infantis, balas e doces, alimentos em geral, brinquedos eletrônicos, fast food, refrigerantes, roupas, pastas de dente, sabonetes, escovas de dentes, shopping centers, jogos de computador, celular e destino das férias. Isso demonstra o grande poder de influência que o publico infantil está exercendo cada vez mais sobre os hábitos de compra familiares.

O consumo considerado precoce pode ter conseqüências no desenvolvimento da
infância. O que acontece, na verdade, é que o conceito de infância na sociedade de
consumo pode estar sendo reformulado, na medida em que hábitos de consumo passam a coexistir com as representações “fantasiosas” presentes no universo simbólico desses indivíduos.
O trecho seguinte, de uma matéria publicada também no jornal O Globo, ilustra como
algumas crianças na sociedade contemporânea estão cada vez mais ligadas em hábitos de consumo:

“A infância está mais curta. Pelo menos no que diz respeito ao consumo. Roupas,
aparelhos eletrônicos, cosméticos e jogos eletrônicos estão cada vez mais no topo
de lista de preferência da garotada, que com isso vai deixando os brinquedos de
lado e entrando mais no universo dos adultos. Pesquisa da Ipsos Marplan, de
outubro de 2006, em nove regiões metropolitanas já aponta para um
amadurecimento precoce do consumo infantil. O estudo, com mais de três mil
crianças, mostra que um terço das que tem entre 10 e 12 anos já possuem celular”

Se de um lado há a “adultização” considerada precoce, com hábitos de consumo
típicos de adulto, gerada, entre outros fatores, pelo contato com a publicidade, os meios de informação e a tecnologia, de outro a personalidade em formação desse público ainda não sabe lidar com tantas opções de escolha: ocorre, então, o que os autores Steinberg e Kincheloe denominam de “crise da infância contemporânea”.
Na ponta do iceberg, carregando as transformações nos hábitos infantis, está a reorganização da estrutura familiar dos dias atuais. Conforme afirmam os autores, “a crise na infância contemporânea pode significar, de várias formas, tudo o que envolva, de algum modo, o horror de enfrentar o perigo sozinho”

A partir dos anos 80, pode-se perceber um movimento de reorganização familiar,
com as mães atuando no mercado de trabalho e o aumento do número de separações. Atualmente, pode-se notar com maior freqüência nos grandes centros urbanos uma dinâmica familiar baseada em pais divorciados, que trabalham fora e por isso acabam por ter pouco contato com seus filhos.
É mais comum que essas crianças sejam cuidadas por terceiros e quando perguntadas
sobre qual o seu maior medo, 95% delas respondem que é a morte dos pais (fonte: Nickelodeon Business Solution Research). Isso evidencia o medo da solidão e o desamparo que essas crianças sentem. Por sua vez, os pais de algumas delas tentam buscar nos presentes e no atendimento à vontade dos filhos uma compensação pela sua ausência. Nesse sentido, os brinquedos dados, as vontades atendidas, o aparelho celular dado à criança reforça a tentativa de os pais estarem mais próximos, de se fazerem presentes de alguma forma, ainda que não seja fisicamente. Porém, com isso, desde cedo as crianças aprendem o mecanismo de compensação através do consumo, tornando-se de fato, pequenos grandes consumidores.

Fontes:

“Pequenos grandes consumidores: uma abordagem sobre consumo infantil na sociedade contemporânea” ; artigo redigido por Alessandra Pinto

Pesquisas primárias feitas pelo grupo

Conversas e troca de idéias com a psicóloga Maria Aparecida Leite


1 comentários:

Oikos Nostrum on 13 de maio de 2011 às 09:35 disse...

Oi, pessoal.
Vejo que estão procurando desenvolver uma reflexão crítica sobre o tema do "Consumo" no mundo infantil. Neste sentido, recomendo fortemente uma visita e análise de conteúdos do Projeto Criança & Consumo do Instituto Alana (www.alana.org.br). Bom trabalho, Rosana.

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